Quando o marca-passo parou! Parte:2

  Tudo pronto, muito nervoso e lágrimas abundantes da mamãe chorona, assim foi Melzinha operar pela sexta vez. Fiquei grudada com Cadu e Cristiano o tempo todo, pedi muita oração a todos que amavam ela.
   A cirurgia acabou à noite, Cristiano e Cadu foram ver Mel, deram vários beijinhos nela e voltaram para Jacobina. Eu pedi que meu esposo arrumasse uma mala com minhas roupas de hospital (sim, eu tinha as roupas apropriadas para UTI) e mandasse no dia seguinte junto com meu carro por nosso motorista de sempre, Marcelo, esse merece destaque, já passamos várias situações nas estradas com Melzinha.
   Nessa mesma noite Melzinha não teve condições de ser extubada, ficou bem desconfortável, lembro que era Reinaldo o fisioterapeuta de plantão, ele me avisou que Melzinha estava dando trabalho.
   No início da semana foi extubada, mas ficou muito desconfortável e precisou voltar pro tubo. Nunca tinha tido falha de extubação antes, fiquei apreensiva.
   Ela foi melhorando e tentaram mais uma vez tirar o tubo. Novamente uma falha de extubação, não tolerou ficar sem o tubo, apenas no Cpap, a freqüência respiratória ficou alta, ela estava com “tiragem de fúrcula”. Foi entubada novamente. Eu me desesperei. Melissa não estava agüentando ficar sem o tubo, não respirava sozinha. Apareceu um edema no local do gerador do Marca-passo, mas drenaram e ficou tudo bem. Eu tinha tanto medo dessa cirurgia, tinha verdadeiro pânico dela.
   Os dias foram passando e tentaram extubar Mel pela terceira vez. Mais uma vez teve falha de extubação. Lembro que Dra Juliana foi a primeira a falar para mim: “Três falhas de extubação já é indicativo de traqueostomia”. Quando ela falou isso, olhei pra ela e disse que de jeito nenhum autorizaria.
   Meu dilema começou aí. Minha filha entubada, sem conseguir sair do tubo, os médicos todos só falavam em traqueostomia, era a única solução no fim do túnel. Eu recusei, se fosse à única solução, não seria feita, ficaria sem minha filha. Vieram: médicos, psicóloga, enfermeiras, fisioterapeutas, todos possíveis e imagináveis me falar sobre a possibilidade da traqueostomia e tentar me convencer. Mas era o meu limite, tudo na vida tem um limite, sempre pensei assim. Eu e meu esposo tínhamos bem claro que faríamos tudo por Mel, menos autorizar a traqueostomia, seria nosso limite. A explicação que dei a todos, darei a vocês.        
   Para mim não era uma simples traqueostomia, seria uma condenação para Mel, ela ficaria presa num tubo assim como ficou dependente da gastrostomia. Melzinha não seria decanulada, o pulmão dela era fibrosado, ela já tinha tido mais de 23 penumonias. Pense aí um pulmão cheio de cicatrizes, para respirar sozinho? Seria muito difícil. Então de que adianta ser criança, sem comer pela boca, sem correr, sem brincar, sem falar e pior de tudo, sem poder nadar na piscina, de quê adianta ser criança assim? Essa idéia me matava, era o único momento que ela era criança como as demais, que ela ficava com os primos na água e não tinha diferença. Ela amava a piscina e eu amava estar com ela brincando na nossa piscina. Sem contar, que ficaria ligada numa máquina respirando, eu precisaria de homecare, não tinha como cuidar sozinha de Mel. Não poderíamos mais viajar, ficaríamos presas em casa. Imagine todos na piscina brincando e Mel, sozinha no quarto, ligada num ventilador (aparelho de entubação), sendo assistida por um técnico. Quem seria feliz assim? Será que ela gostaria de ficar presa num tubo? Será que ela acharia legal não poder mais nadar na piscina? Será que seria feliz assim? Será que se pudesse falar, concordaria comigo? Creio que sim, nossa sintonia era imensa, ela certamente pensaria como eu. Tive o apoio de Dr. Fábio Contelli, Dra Paula Azi, Tássio fisio, Mariana fisio e com o tempo a equipe foi me entendendo. Lembro que encontrei Dr. Contelli no corredor e ele me falou que meu raciocínio estava coerente, que não deixasse isso acontecer com Melzinha.
   O tempo foi passando, eu freqüentava a Mansão do Caminho toda semana, ia às palestras de Divaldo Franco. Numa das terças-feiras fui e pedi para falar com Divaldo, precisava saber se estava correta minha posição de ser contra a traqueostomia. Eu era a terceira da fila, mas faltavam só 15 minutos para começar a doutrinária e não daria tempo falar com ele, então a secretária perguntou se eu queria falar com Dr. Juan. Lembrei da minha amiga Naara falando que ele era maravilhoso, que Sol conhecia ele, que ele era o provável substituto de Divaldo quando este desencarnasse. Não pensei 2x, levantei e disse que poderia ser Dr. Juan.
   Cheguei bem séria, fingindo ser forte, mostrei um vídeo de Mel na piscina sorrindo e nadando comigo. Contei que ela estava na UTI e queriam fazer uma traqueostomia, que eu era contra. Já em lagrimas perguntei a ele, qual era o limite da vida humana. Estávamos na semana do dia das mães, eu só chorava. Dr. Juan olhou para mim, contou que já tinha perdido uma filha na UTI há muitos anos, que doía muito, que até nos dias atuais, ainda chorava a saudade da filha. Mesmo tendo o privilégio da mediunidade. Disse também, que o limite da vida humana vai até quando seus órgãos funcionam sozinhos, passou disso é tortura, não precisa. Falou que a missão de Mel já estava cumprida, pois ela levou milhares de pessoas de todas as religiões a elevarem o pensamento a Deus em oração. Falou que eu também cumpri minha missão, pois aprendi o que é amor incondicional, pois na Bíblia quando Deus fala em dar a vida por outra pessoa, não é você morrer para a pessoa viver, o que ELE diz é que você vai abrir mão da sua vida, para viver em prol de outra pessoa e ser feliz fazendo isso. Foi justamente o que eu fiz. Abri mão da minha profissão, da minha vida, para cuidar da minha filha tempo integral, para amá-la e acompanhar toda a sua rotina de terapias e internamentos. Dr. Juan disse que nosso amor “transcendia”, que era lindo de ver. Me disse que Melissa era um anjo, que ela não sofria como os humanos normais, que ela era diferente e que eu ficasse honrada de ter tido o merecimento de gerar um anjo, pois eram poucos encarnados na Terra. Me disse que eu amasse outros filhos, os filhos de outras pessoas, pois eu era só amor, que eu precisava prometer a Mel que seria feliz quando ela não mais estivesse aqui, para ter o merecimento de estar com ela depois, pois eu sempre fui feliz e precisava continuar a ser.  Falou-me tudo isso e me disse mais, falou que eu não autorizasse a traqueostomia, que eu estava certa na minha decisão, que entregasse a Deus, nosso Pai superior, que Ele resolveria, que entregasse Mel a Deus e confiasse, pois ELE agiria. Despedi-me, chorando muito e pedindo que ele orasse por Mel.
   Nesse dia, Divaldo fez uma palestra linda sobre Mães, falou que ele sentia muito a falta da mãezinha dele. No final da doutrinária, falou o seguinte: “Vou dar 4 conselhos a vocês. Três já existem,um fica por conta do tio Di. Todos riram muito e ele seguiu. Primeiro: Ame à Deus sobre todas as coisas, pois Deus é Deus. Segundo: Ame e honre sua família e seu lar, pois estes serão sua base numa dificuldade. Terceiro: Seja honesto, íntegro, correto, para ter paz de espírito e andar de cabeça erguida. Quarto e último, por conta de tio Di: Tenham amigos, pois quem os têm nunca estará sozinho.Falem a todos que vocês amam, que os amam, pois o tempo não volta. E por fim, vão e estejam com Jesus, porque ninguém vai ao Pai senão pelo Filho. Então fiquem com Jesus.” Eu, Naara e Kelly nos demos as mãos, todas chorando. Ainda tive o privilégio de sentir o perfume de rosas, que indica a presença de Joana de Angelis.
   Voltei leve para o hospital, mais segura que nunca! Se antes eu não concordava, agora eu estava já pedindo papel pra assinar dizendo que não autorizava kkkkkkkkkkk
   Cadu foi para Salvador de carona com meu colega Kércio passar o dia das mães na UTI comigo, voltou de carona com minha prima Alice Guerra. Tá um rapazinho meu filho, viajando sozinho, sem os pais.  Ficou sexta, sábado e domingo na UTI comigo, só na hora de dormir que saíamos. Tocou muita flauta para Mel, tiramos muitas fotos, ficamos bem grudados. Eu fiquei feliz em tê-lo comigo. Dei até uma entrevista para o site Catraca Livre de SP. Foi bem legal!






Comentários

  1. Como diz Roberto Carlos São tantas emoções....são momentos q eu não esqueci....... Mi, Deus capacita os escolhidos tenha certeza. Bjssss pró Vanuza

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    1. Tantas emoções que escorrem pelo rosto ... saudade que machuca ...

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  2. Emocionada com cada palavra lida. Você é uma mãe exemplar. Muitas pessoas precisam conhecer a sua linda história para aprender o verdadeiro sentido da palavra AMOR!!!! MEL tem muito orgulho da mamãe Mirela!

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    1. Eu também tenho muito orgulho dela. Aprendi e sigo aprendendo com minha pequena. Beijão

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  3. Não canso de dizer o quanto é linda a história de vcs. Um amor q não se mede, único e perfeito aos olhos de Deus! Mi, mulher guerreira e admirável. Mel, anjo de Deus q veio p/ nos ensinar o q é amor!

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    1. Mel viverá sem em mim. Foi o melhor presente que Deus poderia me dar. Só me trouxe coisas boas. Beijão

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  4. Acabo de ler seu depoimento, você foi super forte não sei se eu conseguiria mas sei que Deus dá força necessaria no momento certo, Mel tá no céu, fica tranquila, vai curtir a vida com maridão e Cadu...bjinhos

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  5. Você é um exemplo de mulher, tenho orgulho de ser sua tia.
    Deus está dando força para superar essa saudade imensa.

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    1. Obrigada por tudo sempre tia! Deus nos abençoe! Beijão

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  6. Texto lindo, com detalhes, onde o amor se fez e se faz. Onde a presença do mesmo, tempera cada palavra e o deixa fluir cheio de emoção sentida. Parabéns amiga!

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    1. Obrigada amiga. Foi muito emocionante mesmo ❤️��

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  7. Acompanhei pelas suas postagem esse internamento de Mel, mas é emocionante relembrar e ainda mais, saber detalhes!! Ainda custo acreditar q ela se foi e que foi num internamento que eu tinha certeza q daria tudo certo!!Aguardando as próximas postagens. . Forte abraço amiga!! PS: tentei fazer um comentário na postagem anterior, mas não consegui.Karine, mãe de Matheus!!

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    1. Eu também tinha certeza que daria tudo certo amiga. Mas nossos planos são diferentes do de Deus.

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  8. Olá Mirela! Acompanho sua história com Melissa desde os internamentos. Confesso que fiquei muito feliz quando soube do lançamento do blog e futuramente o livro! Acredito, que o blog está ajudando várias mães que passaram/passam pela mesma situação, sejam elas as patologias ou o pós luto. O blog está lindo, espero que você não pare de escrever nunca. você escreve muito bem, parabéns! Que Deus te abençoe e te fortaleça cada dia mais para que você possa seguir sua caminhada que por mais difícil que seja sua missão não acaba por aqui. Esse é o início de um novo capítulo e você tem uma missão muito importante aqui na terra a ser cumprida. Ah, o blog está entre uma delas! Você é luz. Tenho você como um grande exemplo de mulher em diversos sentidos. Gosto muuuuito de você, mesmo sem te conhecer! ��

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    1. Fico muito honrada em ouvir seus elogios. O blog tem sido minha terapia. Espero poder ajudar as pessoas de alguma forma. Um beijo

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  9. Oi meeeu amooor, parabéns pelo blog! Está muito lindo! Parabéns por sua dedicação e por compartilhar conosco um pouco da sua dor e da sua linda história. Continue escrevendo, cada texto sinto uma emoção diferente! Deus te dê forças. Amo você

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