Últimas 24h com Mel...


Naquela sexta-feira 15 de fevereiro de 2019, acordei 5h da manhã assustada porque estava tendo um pesadelo com Mel. No meu sonho/pesadelo nós estávamos as duas deitadas, cada uma em uma maca, ambas fazendo hemodiálise, ambas com câncer, lado a lado. Aí ela olhava para mim e falava: Eu vou desistir. Eu olhava para ela e dizia: Você não vai desistir Melissa. Eu estou aqui “fudida”, doente, cuidando de você, você não vai desistir. Ela olhava para mim, sorrindo, linda e dizia: Eu vou desistir! Eu mais uma vez rebatia: Você não vai desistir Melissa! E ela olhou para mim a última vez e afirmou com um sorriso no lábio e olhar profundo mais uma vez: Eu vou desistir.

Nesse momento acordei com o movimento das enfermeiras. Paloma e Sâmara avisaram que Mel tinha piorado do nada, que precisaram aumentar a FI do ventilador. Quando olhei para o ventilador (aparelho que controla a pessoa entubada), quase surtei,entrei em pânico. Mandei mensagem e liguei para meu esposo, depois para o Dindo dela. Os dois pediram um raio x urgente. Foi coletado sangue, aumentaram todos os parâmetros do ventilador no máximo possível, mais que isso poderia ocasionar um sangramento pulmonar.

Eu estava ali, atônita, lembrando do meu sonho, olhando pro ventilador. Chorando, recolhida, sentindo algo diferente, eu já conhecia “aquele” ventilador de outros hospitais e minha Melissa nunca na vida tinha precisado de parâmetros tão altos. Ela estava curarizada (sedação mais pesada de todas), não reconhecia minha filha mais ali naquele corpo.

Minhas amigas foram para o hospital: Solana, Naara e Daniela Ribeiro. Sol e Dani tinham que ir trabalhar, mas Naa ficou grudadinha comigo, minha ariana espírita que amo tanto.

Era aniversário de minha outra miguxa Marilu, as amigas iam sair para almoçar, eu até tinha confirmado que iria,mas depois do  quadro de Mel não tive condições de sair. Dani voltou na hora do almoço para não me deixar só. Trouxe um laço lindo para Mel.

Meu dia foi cinza, difícil demais. A equipe entrava e saía do leito, todos muito tensos e preocupados. Eles até tentavam me tranqüilizar, que Mel era forte, que ficaria bem, mas avisei as meninas: Nanda enfermeira e Cleinha fisio, que eu já tinha visto esse ventilador antes, no INCOR, no Hospital Santa Izabel, no próprio Hospital Aliança, no leito 03, de Bernardo, eu já sabia como isso acabava, que elas podiam tentar acalmar uma mãe leiga, mas a mim não,eu sabia exatamente o que estava acontecendo,sabia demais como tudo aquilo acabava.

E elas só puderam me abraçar e ajudar a enxugar minhas lágrimas de mãe, que ama sua filha mais que tudo no planeta.

Mel fez um ecocardiograma e Dr. Marcos disse que ela tinha recuperado a função cardíaca do ventrículo esquerdo, que estava com uma fração de ejeção de 44. Falou que acreditava que ficaria tudo bem. Ele me elogiou, falou que eu era quase médica, que faltava só o diploma. Dra Lara (chefe da UTI) entrou na hora e Dr. Marcos frisou isso: Lara, eu estou aqui dizendo a mãe de Mel que ela é como uma de nós, só falta o diploma. Aí Dra Lara, super gentil e simpática disse: também acho Marcos. Mirela é doutora em Melissa, já mandei ela fazer medicina.

Conseguiram um riso meu. Eles sabiam que eu não era doutora de nada, mas sabiam que da minha filha eu entendia, eu sabia tudo que se passava, tinha clareza e consciência da gravidade do quadro dela.

Foi um dia bem difícil. Ligaram para o cirurgião Dr. Fábio Contelli para pegar um novo acesso em Mel, um “Sorense” para hemodiálise, eles precisavam tentar filtrar o sangue dela. Uma última tentativa de reverter o quadro.

Mandei uma mensagem de whats app para algumas amigas dando instrução do que não queria ouvir se Melissa viesse a óbito. Pedi que não deixassem ninguém se aproximar de mim e dizer que foi melhor assim, que ela descansou, que agora eu estaria longe dos hospitais, que Melissa não ia mais sofrer... asneiras desse tipo eu abomino.

Dani Ribeiro e Naara não desgrudaram. O cirugião chegou à noite 19h para pegar o acesso. Eu estava sentada com as meninas na porta da emergência pediátrica, não posso ficar dentro do leito nos procedimentos, não tenho CRM, também não suportaria.

O Dindo e a esposa Thita, chegaram logo em seguida. Eles acharam que eu estaria chorando, mas me viram rindo das conversas de Naa e Dani. O Dindo entrou para ver o procedimento, ele sempre estava presente em todos os momentos de maior aflição minha. Um anjo esse dindo de Mel. Sorte de quem é paciente dele, porque ele é um excelente cardiologista e um dos mais humanos que conheço.

Passou um tempo e me chamaram dentro da UTI, o quadro tinha se agravado, a pressão tinha começado a cair, já estava com doses altas de dobutamina, noradrenalina, todas as drogas possíveis e imagináveis. Mandaram chamar o pai de Mel, só ligariam a hemodiálise quando ele chegasse, pois ela poderia morrer no momento que a máquina fosse ligada,pois a pressão cai muito. E já estava muito baixa. Para vocês entenderem, tipo 6/3 (6 por 3).

Minhas amigas e primas começaram a chegar. Ficou Naara, Daniela Ribeiro, Daniela Lago, Renatinha, primas: Mariana Lanza, Núbia Habib e Natália Habib.

Elas ficaram a madrugada inteira na porta UTI, fizemos orações.

Por volta das 2h da manhã eu estava sentada na porta da UTI com as meninas e me senti mal, tive uma taquicardia. Entrei na UTI para deitar em meu sofazinho, comecei a tremer muito. A enfermeira Danielle aferiu minha pressão e estava 14/9. Alta!!! Liguei para Cristiano e ele mandou que tomasse metade do comprimido de captopril de Mel. Assim eu fiz, segui ordens médicas.

Cristiano chegou 3h da manhã. Pediu para dispensar as meninas, para elas irem dormir. Mas nenhuma delas, mesmo com filhos pequenos (Dani Lago, Mariana e Naara) não quiseram ir embora. As meninas de Miguel Calmon (Alice, Marina, Jamylle, Sirlene, Daiana e Ana) ainda ficaram no celular online com Dani Lago pedindo notícias em tempo real. Minha irmã Samarinha, grávida, dinda de Mel, chorou a madrugada toda no celular comigo. Não dormia. Só chorava. Quando deu 5:10 da manhã de sábado 16 de fevereiro pedi a Dra. Juliana, Verônica e Dani ( enfermeiras) que colocasse Mel no meu colo. A pressão já estava 2/2 (2 por 2). Ela me disse que se mexessem em Mel, ela morreria. Mas não tinha mais nada a ser feito.

Nem a máquina de hemodiálise foi ligada. Então pedi que colocassem Mel no meu colo ainda com vida, mesmo que nos momentos finais. As meninas colocaram, beijei e abracei muito ela. Agradeci por todas as pessoas incríveis que ela trouxe para minha vida, prometi ser forte, sorrir, ser feliz de novo, cuidar de Cadu e de papai. Falei o quanto eu a amava e o quanto ela era importante para mim e a saudade imensa que sentiria dela. Falei que ela podia ir, que podia descansar com Deus, vovô Miranda e bisa vó Dinalva.

A médica veio auscultar 5:15 e falou: ela já descansou.

Eu e Cristiano choramos muito. Autorizei a entrada de Naara e Núbia na mesma hora.

Pedi que tirassem tudo dela, que queria abraçar ela sem fios, sem tubo, sem nada.

Quando tiraram tudo, a tomei nos braços e deitei no meu sofazinho de dormir, abraçadinha com ela, no mesmo travesseiro. Pedi a Cristiano que tirasse a nossa última foto juntas e assim ele fez. Minha foto que vale ouro. Eu e ela. Depois ele também quis abraçar ela sem nada, do jeitinho que ele carregava ela sempre. Eu também registrei esse momento. São nossos. Estarão eternamente em nossos corações.

Cristiano disse que até a morte de Mel foi linda. Porque ela morreu em meu colo.

Não tinha outro lugar melhor para ela que meu colo. Eu amei e amo minha filha de uma forma inexplicável. Nosso elo e o nosso amor transcendiam.

Saí para falar com todas as minhas amigas!!

Muitas outras amigas e primos tinham chegado. Essa galera do Bahia Down é show!! Amo demais vocês.

Então foi assim...  na íntegra nossas últimas 24h.

Só dor...

Obrigada a todos que estiveram comigo no hospital naquelas últimas 24h...


Obrigada a todos que estiveram comigo nessa caminhada... 


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