A Cadeira de Rodas de Mel

A CADEIRA DE RODAS
Abril de 2017, eu e Mel fomos para São Paulo fazer a bendita cadeira de rodas que Mel tanto precisava. Mas antes, deixa eu contar uma história.
Quando tive o diagnóstico da Síndrome de Down em abril de 2013, grávida, chorando muito, uma amiga da área de saúde virou para mim e disse: Mirela, de todas as síndromes existentes, a de Down é a mais tranqüila, são tão lindos, são carinhosos, aprendem tudo, só demoram mais um pouco, vou te mostrar umas fotos para tu veres como são lindos. Complicado seria se fosse autista amiga,alguns têm dificuldade de interação, não sabem expressar o que sentem, tem um tratamento mais difícil. Ou pior ainda se fosse um diagnóstico de PARALISIA CEREBRAL, que trás diversas limitações. Eu só foquei na paralisia cerebral, me deu um Start naquela frase dela, um medo de imediato. Então agradeci ela ter apenas a Síndrome de Down.
Pois bem. Melissa operou em novembro de 2013, implante do marcapasso, teve 3 paradas cardiorrespiratórias, que gerou uma hipóxia.
Na época, falei que minha filha estava estranha, que ela não era daquele jeito antes da cirurgia, mas eu não sabia nada, era nosso primeiro internamento. Foi feita uma tomografia de crânio e disseram que ela só tinha o cérebro atrofiado das pessoas com Down, estava tudo normal. Mas eu sabia que não estava.
Pois bem, Melissa foi acompanhada nos anos seguintes por médicos em SP e Salvador, médicos bons, particulares, hospitais de renome, o próprio pai médico, tio médico, cercada pelos melhores profissionais de saúde. Ninguém nunca abriu a boca para me dizer que minha filha tinha algo a mais que uma simples Síndrome de Down. Só falavam que ela tinha um atraso.
Em meados de 2016, Melissa já internava em Salvador com freqüência, eu já era ativa no Bahia Down e muito amiga de todos. Certa vez estava com minha amiga Regina Hamaji, mãe de Thor, um japonês lindo que escolhi para genro, membro do nosso grupo Bahia Down. Regi disse que marcaria uma avaliação para Mel com a fisioterapeuta de Thor, a melhor da Bahia, Kátia Negrão. Para ver de que forma poderíamos ajudar Mel a se desenvolver mais rápido, pois Mel não sustentava o pescoço, não sentava sozinha, nem andava, não tinha nenhum controle cervical.Na mesma hora disse, pode marcar que eu levo Mel.
Então Regi marcou. Kátia foi à casa de Regi atender Mel. Naquele dia meu mundo caiu. Ela começou a atender Mel, me disse que Melissa tinha Down e Paralisia Cerebral. Começou a me mostrar as características dela que eram do Down e quais eram do PC. Minhas lágrimas começaram a escorrer pelo rosto, na hora veio à fala da minha amiga: PIOR SE FOSSE PARALISIA CEREBRAL. Meu mudo estava caindo naquele momento, eu me senti traída, lesada, não aceitava ser enganada daquela forma, pagando médicos caros na Bahia, acompanhando Mel em São Paulo, no Hospital das Clínicas que é referência nacional, ninguém nunca me deu um diagnóstico desse. Chorei, fiquei sem chão. Kátia me disse que não era médica e não poderia me dar aquele diagnóstico, mas que eu fosse numa neuropediatra, que fizesse um eletroencefalograma, que esse diagnóstico era certo. Mel já tinha feito eletroencefalograma tantas vezes, tanto em SP como em Salvador no hospital Santa Izabel.
Realmente naquele dia, eu fiquei mal. Voltei para Jacobina revoltada, pois poderia estar fazendo fisioterapia para PC desde que ela tinha 5 meses, agora com 3 anos que teria que correr atrás do tempo perdido. Até Cristiano, meu esposo, ouviu meu desabafo, falei que ele como médico tinha obrigação de me dar aquele diagnóstico, mas ele também não sabia, nunca conviveu com pacientes com essa limitação, endocrinologista adulto não tem esse feeling, pois neuropediatria é um mundo a parte. A verdade é que ninguém, nenhum profissional que acompanhava Mel tinha me dado aquele alerta.
Então comecei a correr contra o tempo, fazia fisioterapia nela todos os dias da semana, fazia fono,terapia ocupacional, fazia todo e qualquer estímulo que fosse necessário, comecei a procurar crianças que tivessemDown e PC nos grupos de whatsapp que participava na Bahia e em SP. Não achei nenhum, fique arrasada, ninguém era tão grave como minha filha. Aí depois de um tempo, reencontrei Carol, a mãe de Lorenzo no facebook, ele tinha down e tinha internado no INCOR na mesma época de Mel e Lorenzo também tinha adquirido lá no INCOR paralisia cerebral por hipóxia (falta de oxigênio no cérebro) na cirurgia. Eu fiquei feliz demais, não por ele ter a PC, mas por ter encontrado alguém com o mesmo diagnóstico de Mel aqui no Brasil. 
Conversamos algumas vezes e ainda somos amigas no facebook, trocamos mensagens no whatsapp também
Seguia o fluxo, não tinha tempo para chorar mais, precisava correr contra o tempo, pois Mel precisava se locomover, ela estava pesada, e eu com muitas dores na coluna. Então pensei num carrinho de bebê, aquele estilo guarda-chuva, que podia carregar ela para todo canto. Ia comprar um, mas Roberta Amarante nos deu o que era do filho dela (Rafael), para usar até quando servisse e depois comprava outro. Aceitei o carrinho que foi de Rafael, usamos muito e foi muito útil. 
Mas Mel começou a crescer, matriculei-a na escola em 2017, na APAE de Jacobina, maravilhosa por sinal. Lá me disseram que Mel precisava de uma cadeira de rodas, para que a adequação postural dela ajudasse no aprendizado.Pois ela estava torta no carrinho, que até dores poderia sentir, o pezinho dela não tinha apoio. Deram-me todas as explicações necessárias e me convenceram a fazer a cadeira de rodas. 
Peguei o avião e fui para São Paulo o quanto antes, estava decidida a ir ate à AACD fazer a cadeira de Mel. Chegando lá, falei com Elisângela (Fofa) mãe de Bia, que tem PC. Ela disse que era melhor fazer na Alta Ortopedia, que ficava no Belém, era a mesma equipe da AACD, a cadeira ficaria pronta bem mais rápido e pagaria uns 4 mil a menos. Se na AACD eu iria pagar R$ 10 mil reais na cadeira, lá sairia por menos. Levei um choque com o preço da cadeira.
Mas segui a orientação daquela mãe querida, que já estava na estrada há muito mais tempo que eu.  
Fui para a Alta Ortopedia 11 3804-2268 / 11 99325-7246), fui recebida por Simone, uma querida. Ela me mostrou as cadeiras e os preços, mas já estava instruída por Tássia , Terapeuta Ocupacional de Mel, melhor do planeta, que existiam  duas marcas, a Ortobrás e a Jaguaribe. Eu tinha esquecido desse detalhe e estava comprando a ortobrás, aí liguei para Tássia e ela disse que nãooooo, que alguns pacientes dela que compraram essa marca tiveram problema, que comprasse a Jaguaribe, que era bem melhor. 
Como Deus faz tudo certo, tinha uma Jaguaribe lá, bem mais cara por sinal, que ficaria pronta para eu levar comigo. Fariam todas as adequações posturais, e não esperaria os 3 meses pela confecção dela. Paguei R$ 7 mil na cadeira, parcelado em 5x apenas. Mas escolhi o tecido acquablock que era impermeável, comprei uma cadeira colorida bem linda e estilosa. Ficou linda.
No dia de voltar para Salvador, passamos o dia na Alta Ortopedia para finalizar todos os detalhes, a cadeira ficou pronta às 15h e nosso vôo era 17h, precisávamos estar em 16h no aeroporto de Guarulhos para fazer o check in. Minha prima Rose foi me acompanhar e depois me levar para o aeroporto.
No momento que a cadeira ficou pronta, que colocaram Melissa nela, testaram e liberaram para viajar... entrei no carro de minha prima e comecei a chorar copiosamente, chorava muito, muito,muito, chorava demais. Estava ali decretado que minha filha nunca mais andaria, que estava presa naquela cadeira. Pode ser preconceito, ignorância, pessimismo, mas foi isso que senti. A partir daquele dia eu era mãe de cadeirante, estaria sempre empurrando uma cadeira pelas ruas levando minha filha. Ela não ia andar, não ia correr, não ia brincar de pega pega, não subiria as escadas de nossa casa... Fiquei “fudida”, arrasada, péssima. Minha prima Rose, tão maravilhosa, me consolava, dizia que entendia minha dor, mas que agora Mel teria conforto, a postura dela seria outra, iria ajudar demais no desenvolvimento dela. Eu sabia de tudo aquilo,mas sofri muito, lembrei do dia que foi feita a gastrostomia, que minha filha nunca comeria uma pizza,um bolo de chocolate, uma feijoada... Agora além de não comer pela boca, não andaria mais...  Que mãe não choraria? Que mãe seria tão forte que as lágrimas não escorreriam pelo rosto? Então eu sou fraca, porque chorei demais nessas duas situações. E choraria tantas outrasvezes ao longo dos anos.
Chegamos ao aeroporto de Guarulhos para embarcar, minha prima vendo meu sofrimento disse: “Eu quem irei empurrar Mel na cadeira nova dela, você leva as malas”.
Ela pensou que estava me enganando, mas eu saquei tudo, deixei Rose empurrar a cadeira de Mel no aeroporto e observava que todos olhavam, não passou despercebido por ninguém aquela menina tão pequena, tão linda, numa cadeira de rodas. Comentei com minha prima que todos estavam olhando Mel, aí ela disse: “Estão olhando porque nossa princesa é linda e essa cadeira é muito estilosa, têm que olhar mesmo!”
Santa prima Rose em minha vida! Levou Mel até o portão de embarque e aí eu assumi minha função, já sem lágrimas nos olhos, mas leoa como sempre fui pela minha filha. Levei até a porta do avião a cadeira, peguei Mel e mandei terem cuidado com a cadeira ao guardar, pois era nova. Bem minha cara dá ordens. Eu sou mandona sabiam?
Quando chegamos à Jacobina, eram mil elogios para a cadeira linda e estilosa de Mel, os professores da APAE encantados com a cadeira, Ana Krycia e Samara, as fonosde Mel, apaixonadas pela cadeira, elogiaram a postura que tinham para trabalhar e comentaram que seria muito bom que todas as crianças com deficiência tivessem acesso a uma cadeira daquelas. Eu fiquei e fico arrasada até hoje, realmente é muito cara. Cada ajuste na cadeira eu pagava mais de mil reais e só era feita em SP, tinha que gastar com a viagem, tudo era muito caro, uma pessoa de baixa renda infelizmente não tinha como pagar por aquele bem necessário. 
Aceitei a cadeira, assim como aceitei a gastrostomia, a paralisia cerebral, a cardiopatia, a síndrome de Down e tudo de lindo que Mel trouxe para minha vida, todo o aprendizado adquirido, as pessoas incríveis que ela trouxe para perto de mim, posso afirmar que sou muito melhor depois dela e se DEUS viesse até a mim e perguntasse: “Mirela, você terá apenas Cadu de filho, vai continuar viajando como você adora, cada hora num lugar diferente,mas terá apenas ele como filho. A outra opção é ter Melissa, com Down, PC, cardiopata e levar uma vida de hospital. O que você prefere??” Então eu diria pra DEUS: Mil vezes eu queria Melissa em minha vida e tudo de maravilhoso que ela trouxe para mim
Sou muito grata a DEUS pelo presente lindo que ELE me deu, eu devo ser muito especial para DEUS, porque só recebo presente TOP DELE. Agora estou chorando e sofrendo muito, como nunca achei que suportaria. Mas ELE tem me sustentado, vou seguir confiando nos planos DELE, pois certamente são melhores que os meus. OBRIGADA DEUS, O SENHOR É O CARA!!





Comentários

  1. Nunca chorei tanto na vida,meu deus q saudade da mel,saudade daquele sorriso banguela,daqueles olhos lindos♥️

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  2. Vc é uma guerreira te admiro muito, parabéns.
    Tenho uma filha com síndrome de aicardi, foi desenganada com 8 meses hj ta com 11 anos 5 meses,ao longo destes anos com ela ,desde abril, do ano passado não sei o que é internação, mas vivo uma adrenalina constante misturas de sentimentos, conheci sua história e de mel em uma uti, aqui no hospital de Vitória es,por uma enfermeira, não recordo se é amiga o sua parente, comecei a te seguir cheguei conhece mel, por fotos e vídeos, chorei alto, junto com vc na perda da, até hj sigo vc lembrando, o motivo que passei a te seguir...
    Mas em tudo dê graças, Deus sabe de todas as coisas,nós que não sabemos de nada😘

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